Estava deitada olhando para o teto
pontilhado de estrelas fluorescentes que eu mesma havia feito questão de colar.
As estrelas traçavam intrincadas constelações. Luas e cometas também faziam
parte do pequeno universo colado no teto.
As lembranças da tarde voltavam para
minha cabeça. Assim que chegamos em casa descobrimos que Jean, a moça que
cozinha para nós, havia passado mal e se desculpava em um bilhete por ter que
ir em bora antes de voltarmos, o que significava que eu teria que cozinhar.
Fiquei animada. Nunca aprendi muito bem a cozinha, mas as vezes que Jean me
deixava ajuda-la quando eu era pequena me fizeram gostar.
Assim que vimos o bilhete de Jean em
cima do balcão, olhei para Paul com meu sorriso mais travesso, que ele
respondeu com um aceno, me encorajando. Logo eu estava buscando algo para comer
em todos os armários da cozinha, colocando tudo em cima do grande balcão. Assim
que terminei minha busca, olhei para Paul. Ele estava sentado em uma cadeira
que havia na ponta do balcão e olhava para a mim, sorrindo. Eu ri e voltei para
procurar as panelas.
E nós começamos a preparar nosso
almoço.
Felizmente, Paul sabia alguma coisa
sobre comida, devido ao treinamento, o que me livrou de explodir a cozinha pelo
menos umas três vezes. Depois me lembro de parar e avaliar a situação final da
cozinha.
Pratos de comida pronta que achamos
nos armários e na geladeira, que esquentamos (e tenho que admitir, queimamos um
pouco) e um pequeno bolo de chocolate que saiu (com muita sorte) fofinho do
forno. Havia farinha em todos os lugares, leite derramado em cima da pia e
montes de louça suja. A imaculada cozinha branca estava praticamente
irreconhecível.
A comida havia ficado boa. Quase comi
todo o bolo, mas me segurei para guardar um pedaço para meu pai. Depois de
comer, tentei dar o meu melhor em limpeza e arrumar a cozinha, mas devo admitir
que tive que deixar a louça para lá e foi Paul que fez a maior parte do
trabalho.
Depois me lembrei de quando Paul leu
para mim. Nós dois estávamos no enorme sofá da sala. Adorava quando Paul lia.
Ele sabia recriar os mesmo mundos que eu habitava em meus livros, tornando-os
ainda melhores do que eu sequer poderia imaginar. As pequenas carícias entre os
capítulos faziam breves arrepios percorrerem meu corpo.
Ficamos assim até anoitecer, quando
Paul sabia que tinha que ir. Depois disso me refugiei para meu quarto, onde
tentei terminar o livro que estávamos lendo, mas eu estava distraída demais,
então me contentei em olhar para o teto, sem focalizar em nada, onde estava até
agora.
O familiar barulho da porta da frente
me despertou. Sentei na cama e olhei para a porta fechada, ajeitando minha
roupa. O familiar barulho do sapato social no assoalho da escada me dizia que
era o papai. Como sempre fazia, ele surgiu na porta, agora aberta, sorrindo
para mim.
- Entre papai! – eu disse,
respondendo com um sorriso caloroso para ele.
Cheguei mais para trás na cama
enquanto ele adentrava o quarto com suas longas e suaves passadas.
- Kate, querida, como foi a tarde? –
perguntou ele, sentando na beirada da cama.
- Foi ótima – respondi – Fizemos um bolo, depois podemos dividir o resto
dele.
- Jean os ajudou? – ele perguntou.
- Oh, Jean não estava muito bem e não
pode ficar aqui a tarde... – Respondi hesitante. O rosto de papai ficou sério –
Mas deu tudo certo, Paul me ajudou e foi só uma tarde, não é mesmo? – Sorri.
Ele pareceu pensar por um instante.
- É claro, é claro. Tudo bem.
Suspirei. Papai não era muito bem
receptivo com surpresas assim, e ele podia ter um gênio bem inflamado quando
algo o aborrecia.
- Kate, tenho uma ótima notícia! –
ele exclamou – Um casal cliente de Madame Machmaker desistiu da reserva que
fizeram para semana que vem, e talvez eu tenha conseguido essa reserva para,
quem sabe, sábado que vem? – disse, sorrindo travessamente para mim.
Pensei na informação por um momento.
Sábado era meu (tão esperado, pelo menos por mim) aniversário. Madame Machmaker
era simplesmente a dona do melhor salão de festas de Manhattan. Minha festa de
15 seria lá, mas alugaram primeiro. Papai queria negociar com o casal que faria
sua festa de casamento lá, mas eu o impedi, pois não queria estragar os planos
deles, e, não via o porquê de fazer uma festa daquele porte, pois eu não tinha
amigos para festejar comigo.
Agora eu estava em uma situação
semelhante, mas as feições de papai demonstravam tanto orgulho por seu feito
que tentei fazer o melhor possível para espelhar o seu entusiasmo.
- Papai, isso é incrível! – exclamei
o mais animada que consegui e me ergui para abraça-lo.
Parecia que eu havia conseguido
convencê-lo. Ele gargalhou e me abraçou de volta.
- O que acha de comermos aquele bolo
que você falou? Estou com muita fome – ele sorriu – Vamos ver se minha pequena
Kate herdou a capacidade inacreditável da mãe na cozinha – disse presunçoso.
Sorri, dessa vez sincera.
- Duvido.
Minha resposta o fez soltar mais uma
risada.
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